“"Quem não pode com o pote, não pega na rodilha”, ensina a sabedoria do sertão.
O que o futuro reserva ao Rio Grande do Norte até o final da gestão Fátima Bezerra (PT) não é fácil prever. Oráculos, pitonisas, cassandras, torcedores do contra/a favor, fanáticos, economistas e jornalistas podem lavrar todo tipo de previsão, mas nada com absoluta segurança.

Entretanto é fácil identificar que, até o momento, Fátima e seu governo seguem uma assustadora coreografia do atraso que leva o estado a rebolar em marcha à ré. “Passinho para frente, passinho para trás; bota a mão no joelho, dá uma baixadinha…”, bem poderia ser a letra dessa dança na voz e remelexos do vetusto É o Tchan!.
A observação aqui não é manifestação de vontade ou opinião “do contra”, ideologizada ou marcada por algum interesse contrariado ou recalque. Fatos em sequência mostram que o governo petista não tem pulso, rumo ou prumo.
Fazer/desfazer, decidir e recuar (às vezes em questão de horas) são uma rotina administrativa e política do Governo Fátima Bezerra em pouco mais de sete meses. Coleção de episódios revela fraqueza para sustentar o que decide (certo ou errado). Lembremos alguns.
Licença-prêmio
Lá no começo, janeiro ainda, a governadora suspendeu o gozo e pagamento de licença-prêmio até o dia 31 de dezembro deste ano. Aquele lema da esquerda contra os governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PSL), “nenhum direito a menos”, morreu em suas mãos. Pressionada pelo sindicalismo lulopetista, ela desistiu da medida. Ficou o dito pelo não dito. Recuou.
Governo do Estado enviou um projeto de lei à Assembleia Legislativa para reduzir o limite das Requisições de Pequeno Valor (RPVs) de 60 para 10 salários mínimos (atuais R$ 59.880 para R$ 9.980). A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Seccional do RN, estrilou. Disse em nota que a governadora queria “transferir o ônus da situação financeira do Estado para quem menos contribuiu para ela”. Ela fez o quê? Recuou.
Motoristas de aplicativos como Uber foram proibidos de atuar no Aeroporto Internacional Aluízio Alves, em São Gonçalo do Amarante. Irados, eles foram para ruas e estradas, numa mobilização desgastante para a gestão da ex-sindicalista Fátima Bezerra. Não teve jeito: acabou determinando que o Departamento de Estradas e Rodagens (DER) não criasse caso. “Foi um equívoco”, procurou explicar. Ou seja, recuou.
Tentou levar com a barriga o concurso para contratação de pessoal à Polícia Militara do RN, que se arrasta desde 2017. A estratégia era convocar o pessoal em 2021. A partir de uma audiência pública na Assembleia Legislativa, promovida para tratar do assunto, com proposição do deputado estadual Allyson Bezerra (Solidariedade), a manobra se tornou frustrada. Restabeleceu prazo para 2020. Recuou.
Hospitais
Agentes penitenciários queixaram-se do corte em sua alimentação. O Governo Fátima Bezerra até ameaçou fincar pé na medida, mas depois a Secretaria Estadual da Administração Penitenciária (SEAP) ajustou um acordo para não botar mais fogo nessa relação conflituosa. Recuou.
Era certo o fechamento do Hospital Doutor Ruy Pereira (Natal) desde a fase de transição, mesmo antes da posse de Fátima em 1º de janeiro último. O anúncio de encerramento de atividades do hospital causou uma convulsão no meio médico e opinião pública. A versão governista é de que na verdade tinha ocorrido um “mal-entendido”. Recuou.
Com o Hospital Varela Santiago (Natal), outro estresse. Dívida do Estado com essa instituição virou disse-me-disse, com o secretário de Estado da Saúde Pública (SESAP), Cipriano Vasconcelos, chegando a afirmar que não haveria esse passivo. O burburinho fez a governadora mudar o discurso e estratégia, determinando renovação de convênio e pagamentos. Recuou.
O Governo Fátima Bezerra decidiu revogar o reajuste que imporia mês passado sobre o valor do condomínio dos comerciantes permissionários da Centrais de Abastecimento do RN (CEASA). Protesto nas ruas, alarido nas redes sociais e imprensa, levaram a governadora a repensar o assunto. Recuou.
Fátima saçaricou para andar para cima e para baixo, em Natal e no interior, num carro blindado pago pelo erário esquelético do estado. A dispensa de licitação foi logo abortada pelo próprio Gabinete Civil; mas o estrago já estava feito. Recuou.
“Calote”, perseguição e Reforma da Previdência
Houve ensaio de institucionalização de um calote nos prestadores e fornecedores do Estado, com créditos oriundos da administração Robinson Faria (PSD). O governo Fátima Bezerra avisou na imprensa que faria pagamento em ordem cronológica e se tivesse dinheiro, sabe-se lá quando.
Tratado como “caloteiro” em nota da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do RN (FECOMÉRCIO/RN), o governo remendou. Foi criado o Comitê de Relacionamento com Fornecedores (COREF) para tratar desses débitos e ensejar os pagamentos. Enfim, recuou.
Por pressão política, Fátima Bezerra tirou o Tenente PM Hugo Pierrre dos Santos Madeiro do papel de subcoordenador do 2º Distrito da Polícia Rodoviária Estadual (DPRE) em Assu. Acossada por organizações militares que viram o episódio como “perseguição política”, desfez o que fez. Tornou o ato sem efeito. Recuou.
Numa alcateia com outros governadores nordestinos, Fátima Bezerra empunhou bandeira contra a Reforma da Previdência e Governo Bolsonaro até a 25ª hora. Sem saída, despachou o vice-governador Antenor Roberto (PCdoB) para dizer em Brasília, em seu nome, que endossaria a matéria. Recuou.
Determinou há poucos dias, que todo cumprimento de “reintegração de posse” determinado pela Justiça do RN, a ser levada a termo com uso de força policial-militar, passaria primeiro pelo crivo do Executivo. O disparate foi logo esclarecido como novo mal-entendido. Recuou.
Essa semana, o Instituto de Previdência do Estado do RN (IPERN) cientificou a Universidade do Estado do RN (UERN), que o auxílio-saúde dos inativos instituição não seria mais coberto. Em erupção, os segmentos universitários foram pro ataque.
O assunto rendeu (e rende) ataques ferozes de bolsonaristas/direitistas e setores da imprensa, criticando o corte desse benefício social. Em poucas horas, tudo foi revisto. Teria acontecido, mais uma vez, desinformação, mal-entendido etc. Recuou.
Um passo à frente, outro atrás. O Governo Fátima Bezerra não tem forças para sustentar minimamente o que escreve em resoluções, decretos, projetos de lei ou manifesta em entrevistas. Não se sustenta porque não sustenta as próprias decisões.
Tem medo de aruinar sua biografia, tem medo de bater de frente com o corporativismo funcional, tem medo de mexer com o status quo. Falta-lhe coragem para ser governo e contrariar.
“Caráter democrático”
Há uma acefalia governamental que ela personifica, que se diga.
A Governadoria é um anexo da Assembleia Legislativa e puxadinho do sindicalismo que ela ajudou a construir no Rio Grande do Norte. A redução de custeio que afirma ter obtido nesses meses e projetados para os quatro anos, é irrisória e pífia. Economia de ponta de lenço, repetimos como mantra.
Voltar atrás em decisões uma vez ou duas, foi justificada por seguidores, militantes e porta-vozes como característica do “caráter democrático” da governadora. Mas nesse volume, frequência, não. É sintoma de tibieza. É fraqueza mesmo, num português claro.
A governadora de origem paraibana que fez do sindicalismo a catapulta de sua trajetória na política partidária, no RN, não revela destreza e fibra para domar o ‘elefante’ que recebeu. Foi-lhe entregue com quase quatro meses de salários funcionais em atraso (mais de R$ 1 bilhão), sufocado com cerca de R$ 2,4 bilhões de passivos com fornecedores/prestadores de serviço e um déficit em folha de pessoal da ordem de R$ 130 milhões/mês.
“Quem não pode com o pote, não pega na rodilha”, ensina a sabedoria do sertão. “Um fraco Rei faz fraca a forte gente”, contava Luis Vaz de Camões, em sua narrativa poética contida em “Os Lusíadas”.
Carlos santos
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